sexta-feira, 27 de março de 2009

A Letra

“Olhe para qualquer lado e você verá uma palavra escrita sobre alguma coisa. A escrita é uma das grandes invenções humanas, definiu os rumos da civilização. Toda palavra escrita tem uma forma e esta forma é resultado de escolhas técnicas mas também estéticas, portanto ideológicas. Por isso, eu não acredito em neutralidade. Há uma inter-relação da forma com o conteúdo. A tipografia é importante porque dá forma à escrita. Seja em uma placa de trânsito com a palavra PARE ou em um site com bilhões de palavras, a fonte vai expressar algo que pode ser coerente com a informação e com a função do texto mas que, não raro, pode ser conflituante ou gerar ruído.” Esta foi a resposta de Ricardo Mayer (http://www.ricardomayer.com/) aquando numa entrevista lhe perguntaram “Qual a importância da tipografia?”. De facto, este designer consegue exprimir nestas linhas o valor que a letra tem e que, usualmente, não valorizamos.

As letras não são meramente aquilo que olhamos. É preciso vê-las. É através do ver que conhecemos o objecto do nosso olhar para, assim, conseguirmos perceber o que a tipografia transmite. O tipo de letra utilizado pode-nos transmitir muito mais que a identificação da letra. Por via dele podemos conhecer a personalidade da letra e, consequentemente, a personalidade de quem a escreve e/ou publica. Este vídeo apresenta a vertente mais teórica da tipografia.

Quando o meu pai, no primeiro Natal do meu irmão, lhe ofereceu um conjunto de livros acerca do abecedário português eu achei um disparate. O rapaz ainda começava a palrar e já tinha uma colectânea de livros de A-Z para ler. Agora, pensando melhor, vejo que o meu pai sabe o quanto são importantes as letras nas nossas vidas. Ouso dizer que se o ponto é a unidade mínima da comunicação visual, a letra é a unidade mínima da comunicação verbal e escrita.

Muitas vezes, as palavras assumem-se como personagens e ganham relevo. Por vezes, a fonte acaba por ter mais relevo que o próprio conteúdo pois acaba por ser “um dos elementos que contribuem para a construção de uma linguagem de um conceito, não só pela informação escrita mas também pela expressão formal que vai formar”, como afirma Ricardo Mayer.

Atentemos no seguinte vídeo:

Para verificar se a letra se assumia efectivamente como personagem, pedi colaboração ao meu irmão (8 anos) que ainda não consegue perceber este nível escrito de inglês. Na primeira visualização pedi-lhe que me dissesse palavras que a imagem lhe fizesse lembrar. Ele disse tiros e morte. Na segunda mostra pedi-lhe uma descrição mais detalhada sobre as primeiras quatros cenas. O resultado foi o seguinte: 1) Letras a arrastarem-se e deixar rasto; 2) letras a saírem fora do sítio; 3) três tiros e algumas das letras a explodir e outras a fugir e gritar; 4) fogo nas letras e estas a transformarem-se em cinza. A minha conclusão foi que uma criança, apenas através de letras, consegue perceber o conteúdo que a publicidade pretende transmitir. Das quatro cenas só uma (cena 2) é que o significado não lhe foi tão compreensível de uma forma tão exacta pois, de resto, a mensagem foi comunicada correctamente apenas com a movimentação das letras. Isto só prova que a letra assume-se como o principal elemento desta publicidade.

Ademais, existe um conforto visual alcançado por uma escolha adequada da fonte tipográfica, o posicionamento do texto tendo em conta a movimentação das letras e o contraste entre a cor de fundo e a cor dos caracteres.

Em tom de conclusão, é interessante voltar a ver coisas tão habituais e tentar compreender se a tipografia utilizada reflecte algo dado que em muitas ocasiões a fonte tipográfica, a composição do texto, os tons utilizados e até o próprio tamanho trasmite, por si só, uma mensagem.

versão 0.1

Para realização deste artigo recorri aos seguintes sites:

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